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28 anos depois, ou quase isso, o diretor Danny Boyle retorna à franquia dos zumbis maratonistas com "Extermínio 3: A Evolução".
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Sou velha o suficiente para me lembrar de quando o inglês Danny Boyle era um novo diretor experimentando com o digital. Quer dizer, ele já tinha lançado alguns títulos elogiados, como “Cova Rosa” e “Trainspotting”, mas ainda não tinha vencido o Oscar por “Quem Quer Ser um Milionário?”, que foi o auge de sua carreira em Hollywood.

Com “Extermínio” (uma tradução ruim para o título original “28 Days Later”), Boyle trazia a novidade da gravação feita com uma mini-DV comum, e não em película. Embora não tenha sido o primeiro, ele fez parte de uma onda do início do século 21 que incluiu George Lucas, James Cameron, David Fincher e Steven Soderbergh.

Mais acalorado do que o debate “filmes digitais são cinema?”, porém, era o debate “zumbis correm?”. “Nightmare City” e “A Volta dos Mortos Vivos” já tinham zumbis mais espertinhos, mas a imagem prevalente na época ainda era a de uma criatura lenta, sem energia, como no clássico de George Romero.

“Extermínio” foi, em 2002, o primeiro filme “sério” com zumbis maratonistas, o que dividiu os fãs do subgênero. De minha parte, mesmo achando sinistra a figura de uma ameaça que se aproxima vagarosamente, o perigo galopante e a premissa científica me pareceram mais assustadores. Duas décadas depois, Boyle deu um jeito de otimizar a criatura ainda mais.

No novo “Extermínio 3: A Evolução” – que se passa 28 anos depois do primeiro, mas que não está sendo lançado 28 anos depois, para o tormento daqueles com TOC – os infectados pelo vírus “zumbificante” já se organizam em tribos. Os “alfas” são exatamente o que o nome sugere, isto é, os líderes destes bandos, os mais fortes, os mais inteligentes e os mais perigosos.

Interpretado pelo novato Alfie Williams, Spike é um garoto que acaba de completar 12 anos. Seu pai Jamie, vivido por Aaron Taylor-Johnson, quer levar o menino para um ritual de passagem, uma espécie de Bar Mitzvah distópico. Neste ritual, o menino deve abandonar a ilha onde vive e ir até o continente infestado para matar o seu primeiro zumbi.

Com uma montagem que mistura cenas históricas, Boyle traça um paralelo entre o extenso histórico britânico de guerras e a militarização em que a comunidade de “Extermínio 3” vive. Jamie é um pai severo, que quer endurecer Spike para ter certeza de que ele irá sobreviver – que o filho se torne tão brutal quanto um “alfa”.

Numa sociedade tomada pelo medo e pela violência, os atributos tipicamente masculinos da agressividade e da força física se sobrepõem aos demais. Enquanto isto, Isla – Jodie Comer no papel da mãe de Spike – vive isolada num quarto. Delirando por conta de uma doença misteriosa, ela não recebe tratamento algum, pois não há médicos na ilha (mas muitos arqueiros).

Entre a hostilidade de um lado e a vulnerabilidade do outro, Spike decide procurar um médico que possa curar a sua mãe. Há muito sangue em “Extermínio 3” – para matar os não-infectados, o método de preferência do “alfa” lembra o videogame “Mortal Kombat” – mas o filme tem também um quê de Studio Ghibli ou, mais precisamente, “Ni no Kuni”.

Em sua jornada proibida pelo continente, Spike terá de amadurecer, mas não da forma que o seu pai desejava. Ainda bem que a voz aveludada do ator Ralph Fiennes, como o excêntrico Dr. Ian Kelson, serve como um alento – tanto ao protagonista como ao espectador.

Aos 63 anos, Fiennes decidiu exibir os músculos torneados como Odisseu em “The Return” e, agora, em “Extermínio 3”. Talvez, o veterano seja a representação justamente deste ponto médio entre a masculinidade brucutu e a gentileza para com o próximo. O problema da solidão masculina é a do doutor excluído como um pária, mesmo com tanto a oferecer.

Como não poderia faltar algum tipo de invencionice, Boyle filmou o terceiro filme utilizando iPhones (inclusive, criando um efeito de bullet-time com 20 aparelhos). A qualidade das imagens, no entanto, já não se difere tanto assim de uma câmera profissional, então o diretor experimenta com movimentações – um “tranco” que ele que dá na sequência quando algo violento ocorre.

Boyle propõe também um outro debate para o fandom dos zumbis, mas não quero dar spoilers com relação a isto. A franquia já tem mais dois filmes em produção, um dirigido por Nia DaCosta e outro dirigido por Boyle. Além do roteirista Alex Garland, Cillian Murphy, que estrelou o original, também deve retornar.

É bom poupar o fôlego, caso seja preciso correr.

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