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O pesadelo apocalíptico de Nós

Jordan Peele retorna ao terror para discutir o nosso pior inimigo.
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“’Nós’ é um filme de terror”, esclareceu o diretor Jordan Peele. O comediante da dupla “Key and Peele”, programa de esquetes da Comedy Central (e 100% disponível no YouTube), estreou na direção de cinema com “Corra!”, um sucesso estrondoso que também lhe rendeu, no ano de 2018, o Oscar de melhor roteiro original. Desde então, Peele assumiu o posto de mais novo expoente do gênero e vem trabalhando em novas versões de “O Mistério de Candyman” e da série clássica “Além da Imaginação”.

Para quem conhece o trabalho de Peele como humorista, o salto da comédia para o terror não é tão grande assim. As situações retratadas em “Key and Peele” se baseiam em observações da sociedade, às vezes relacionadas com questões de raça, mas sempre levadas ao extremo. Neste sentido, tanto a comédia como o terror lidam com o absurdo, com coincidências estranhas ou acontecimentos inesperados que desafiam o espectador a contemplar o bizarro. Dependendo do ponto de vista, o argumento de “Nós” pode ser tanto cômico como assustador.

Na cultura germânica, um “doppelgänger” é uma espécie de sósia idêntico, mas de origem sobrenatural, como um fantasma ou uma sombra de nós mesmos, e que geralmente representa um sinal de mau agouro. O conceito já foi bastante explorado em desenhos animados, em comédias com cenas em que um personagem copia os movimentos do outro para criar um “espelho”, e também por toda a história do cinema de terror, desde “O Médico e o Monstro” até “Invasores de Corpos”, “Um Corpo que Cai”, “Solaris”, “Cisne Negro” etc..

Sem dar qualquer tipo de spoiler, “Nós” é o embate final entre a família Wilson, encabeçada por Lupita Nyong’o e Winston Duke, e todos os seus doppelgängers. “Acho que o filme se aplica a qualquer versão de ‘nós contra eles’”, disse Peele. “Seja uma família contra outra família do outro lado da rua, sua raça contra outra raça, sua classe socioeconômica contra a outra, ou a ideia americana de nós mesmos contra o resto do mundo. Acho que estamos condicionados a apontar o dedo contra ‘eles’ e o filme aponta o dedo para nós mesmos. Somos muitas vezes o nosso pior inimigo, de todas as formas possíveis”.

De fato, toda a primeira parte de “Nós” trata da ansiedade paralisante de Adelaide Wilson (Lupita Nyong’o, ganhadora do Oscar de melhor atriz coadjuvante de 2014, e que só agora encara o seu primeiro papel principal). O diretor mantém a tensão graças à performance memorável de Nyong’o, além da beleza assustadora de uma trilha sonora única. Winston Duke, o M’Baku de “Pantera Negra”, também oferece um alívio cômico bastante eficiente como o pai da família.

Com um terceiro ato que descamba para o apocalíptico, Peele ainda derrapa em seus finais, quando tenta expor, assim como fez em “Corra!”, toda a logística da metáfora – a alegoria do filme seria muito mais forte sem qualquer tentativa de explicação lógica – mas o seu talento como diretor é inegável, criando imagens indeléveis, como as tomadas de cima que formam sombras perfeitas dos personagens, e sempre com as melhores atuações de suas estrelas.

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