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Amazon Prime: Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo

Indicado a 11 Oscars, queridinho da A24 celebra carreira de Michelle Yeoh.
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Em noites de insônia, eu me questiono como teria sido a minha vida se tivesse feito ou falado algo diferente em um momento específico quinze ou vinte anos atrás. Eu seria mais feliz? Mais rica? Estaria casada? Com filhos? Ou estaria pior? Depois de ruminar madrugada adentro, adormeço concluindo que nada disso importa, embora persista a sensação de que algo foi perdido no meio do caminho.

O ressentimento, que nada mais é do que a recusa em aceitar as coisas como elas são, nos leva ao desespero, ao niilismo. Ficamos mais amargos, afastamos aqueles que nos amam e, muito frequentemente, nos tornamos violentos, com os outros e com nós mesmos. É como um buraco negro que consome tudo ao seu redor – um grande abismo no formato de algo insignificante, como um bagel.

Dirigido por Daniel Kwan e Daniel Scheinert, dupla conhecida como os Daniels, “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” fala diretamente com quem acha que, em algum universo paralelo, há uma versão sua levando uma vida melhor. Com onze indicações ao Oscar, inclusive na categoria de melhor filme, o queridinho da produtora A24 bateu recordes de bilheteria mundo afora e foi tanto atacado como defendido com unhas e dentes nas redes sociais.

No papel de sua carreira, Michelle Yeoh interpreta Evelyn, dona de uma pequena lavanderia que caiu na malha fina da receita federal. Enquanto tenta salvar o próprio negócio, ela também precisa lidar com um marido insatisfeito (o magnífico Ke Huy Quan), uma filha desesperada por aceitação (Stephanie Hsu) e um pai idoso que não aprova as suas escolhas (James Hong, que acabou de completar 94 anos).

O espectador já conhece o conceito de multiverso, tão explorado no mundo dos quadrinhos, seja pelo bom exemplo de “Aranhaverso” ou pelo mau exemplo da Marvel como um todo. A Evelyn deste universo, em particular, é a que mais acumula fracassos e frustrações, o que a torna perfeita para assimilar as habilidades dos seus vários “eus” e enfrentar um mal que coloca a humanidade, em suas formas mais variadas, em risco.

 “Tudo em Todo Lugar…” lembra muito “Matrix”, no sentido em que uma pessoa comum, escolhida a dedo pelo destino, desbloqueia todo o seu potencial depois de atingir uma espécie de nirvana. Na ficção científica das irmãs Wachowski, Neo toma consciência de que a realidade pode ser dobrada (a colher, afinal, não existe) e, em meio ao sofrimento da raça humana, o amor é a única coisa que faz sentido.

A obra dos Daniels tem o mesmíssimo argumento, mas a originalidade está no contexto da família de imigrantes asiáticos (Yeoh nasceu na Malásia, Quan é do Vietnã, Hong e Hsu são descendentes de chineses). Os filmes de ação dos Estados Unidos, incluindo “Matrix”, sempre beberam das artes marciais asiáticas, contratando coreógrafos como Yuen Woo-ping ou o próprio Ke Huy Quan. Nada mais merecido do que um filme americano com asiáticos como protagonistas.

Também estamos falando da celebração da carreira de uma atriz de 60 anos, com inúmeros filmes de artes marciais em sua filmografia, que nunca havia sido indicada ao Oscar. Se “Matrix” tem como herói um homem branco, usando óculos escuros e sobretudo preto, aqui temos uma heroína improvável na figura de uma senhora de alguns cabelos brancos, que carrega os recibos de sua lavanderia num carrinho de feira.

Da mesma forma, seria improvável ver Quan como um galã, mas é difícil não suspirar quando ele diz que, em outra vida, adoraria estar lavando roupas e fazendo declaração de renda com Evelyn. “Improvável” é, talvez, a palavra que melhor define “Tudo em Todo Lugar…” – um filme de orçamento modesto, mas que fez sucesso na bilheteria; um filme tão absurdo, mas que também faz chorar; um filme tão particular e, no entanto, tão universal. É improvável, mas pode acontecer.

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