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Indicado em 3 categorias do Oscar, "Guerra Fria" é uma espécie de Romeu e Julieta do século 20, com uma sucessão de pequenos suicídios.
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Indicado ao Oscar nas categorias de filme estrangeiro, fotografia e direção, “Guerra Fria” é uma tragédia austera, sem lição de moral ou efeito catártico. Com apenas 88 minutos de duração, o romance lacônico dirigido pelo polonês Pawel Pawlikowski, o mesmo do celebrado “Ida”, não oferece motivações ou justificativas para as atitudes de seus personagens. Zula (Joanna Kulig) e Wiktor (Tomasz Kot) são amantes destinados à ruína: artistas divididos entre a terra natal sob o domínio rigoroso da União Soviética e o desejo de escapar para o oeste capitalista – onde a felicidade também se provará impossível.

Wiktor conhece Zula em uma série de audições musicais que o crítico David Ehrlich chamou de “American Idol pós-apocalíptico”. No começo do filme, Wiktor e a parceira Irina (Agata Kulesza) vasculham vilarejos pobres para formar um companhia de cantores e dançarinos dedicados à música folclórica. Na fachada da mansão decrépita em que os artistas são treinados, um funcionário tenta estender uma faixa que diz “Bem-vindo ao futuro!”, mas acaba se desequilibrando e caindo da escada – o futuro não foi desta vez. Com canções típicas que falam de relacionamentos amorosos, o governo soviético comanda que os músicos passem a cantar em homenagem a Joseph Stalin, para que possam viajar em turnê por toda a União Soviética. Wiktor fica incomodado, mas Zula parece não se importar.

“Guerra Fria” começa em 1949 e vai até meados dos anos 1960. Zula e Wiktor vão e voltam, sempre manifestando o amor eterno que um sente pelo o outro com gestos variados de auto-destruição. Depois que Wiktor foge de uma apresentação na Berlim Oriental e se estabelece como pianista de jazz em Paris, Zula se casa com um italiano só para migrar legalmente ao oeste e poder reencontrá-lo (um dos primeiros de uma série de sacrifícios dos apaixonados). Em uma Europa devastada, enfrentando um pós-guerra traumático, a relação conturbada dos dois – uma espécie de Romeu e Julieta do século 20, com uma sucessão de pequenos suicídios – ilustra um cenário emocional de terra arrasada, em que a paz não é mais víavel.

Tudo parece ainda mais opressor com a fotografia em preto e branco de Lukasz Zal, também responsável por “Ida”. A descentralização dos objetos e o formato mais apertado da tela, com a proporção de 4:3, parecem espremer os atores na parte inferior do quadro, fazendo com que eles fiquem sem possibilidade de reação. O enorme espaço negativo dos enquadramentos reflete a ansiedade de Zula, infeliz com o oeste e com o disco “vazio” que ela mesma gravou. Para Wiktor, o jazz também tem um limite – em uma das cenas, seu improviso cacófono no piano da boate faz os outros músicos, embasbacados, pararem de tocar. A mudança nos estilos musicais, do folk autêntico aos ritmos do ocidente, é importante, pois narram a sensação de deslocamento de dois personagens expatriados e perdidos.

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